Por Múcio Magalhães
Vereador do Recife
O médico, geógrafo, cientista social, professor, político e escritor Josué de Castro nasceu no Recife, em 5 de setembro de 1908 e faleceu no exílio em Paris, em 24 de setembro de 1973.
Josué de Castro dedicou a sua vida e todo o seu talento e conhecimento para chamar a atenção dos governos, e sociedade em geral, para o problema da fome e da miséria, que em sua época se constituía como um dos mais graves problemas do mundo e que, ainda hoje, ocorre em proporções absurdas para o que a humanidade já acumulou de conhecimento.
Entre os diversos livros e ensaios publicados por Josué de Castro, o mais famoso é Geografia da Fome, que este ano completa 65 anos de história. Publicado em 1946, o livro apresentou um dos mais profundos estudos sobre a questão da insegurança alimentar existente no Brasil.
Para escrever o livro, Josué de Castro viajou por todo o Brasil, e resolveu dividir o País em 5 áreas alimentares: área amazônica; área do Nordeste açucareiro; área do sertão do Nordeste; Centro-Oeste e extremo Sul, aprofundando o estudo sobre o processo de colonização, da produção de alimentos e nutrição, ou falta dela, identificou as causas e conseqüências da fome e da desnutrição dos povos de cada uma dessas áreas.
No prefácio do livro Geografia da Fome, Josué de Castro deixava evidente que seu objetivo se distinguia de todos os outros estudos já realizados sobre a fome no mundo, ao afirmar: “O nosso objetivo é analisar o fenômeno da fome coletiva — da fome atingindo endêmica ou epidemicamente as grandes massas humanas.”
Na época da publicação do livro, o tema fome era solenemente ignorado pelas autoridades mundiais. Muitos inclusive registravam o fenômeno da fome como algo natural, de solução impossível, que sempre existiu e que sempre existirá. Combatendo esse argumento, Josué de Castro ainda no prefácio afirmava: “foram os interesses e os preconceitos de ordem moral e de ordem política e econômica de nossa chamada civilização ocidental que tornaram a fome um tema proibido, ou pelo menos pouco aconselhável de ser abordado publicamente”.
Em seus estudos, Josué de Castro identificou que uma das principais causas da fome no Brasil era a concentração de terras. Ao tratar da fome no sertão do Nordeste ele escreveu: “Todas as medidas e iniciativas não passarão de paliativos para lutar contra a fome, enquanto não se proceder a uma reforma agrária racional que liberte as suas populações da servidão da terra, pondo a terra a serviço de suas necessidades.”
Nas conclusões do livro Geografia da Fome, no capítulo Estudo do Conjunto Brasileiro, ele afirmou: “é indispensável alterar substancialmente os métodos da produção agrícola, o que só é possível reformando as estruturas rurais vigentes. Apresenta-se deste modo a Reforma Agrária como uma necessidade histórica nesta hora de transformação social que atravessamos: como um imperativo nacional”.
Com suas obras, Josué de Castro quebrou o silêncio sobre o tema da fome. Seus livros e ensaios foram traduzidos para mais de 25 idiomas. Com esse reconhecimento internacional, recebeu duas indicações ao Prêmio Nobel da Paz e assumiu a presidência da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) entre os anos de 1952 a 1956.
Muitas são as frases de Josué de Castro que se tornaram célebres e popularizaram a problemática da fome no Brasil, uma delas afirma: “Metade da população brasileira não dorme porque tem fome; a outra metade não dorme porque tem medo de quem está com fome”; em outra ela aponta a causa primordial: "Denunciei a fome como flagelo fabricado pelos homens, contra outros homens”.
Passados 65 anos da edição do livro Geografia da Fome e 38 anos da morte de Josué de Castro, é com muita tristeza, indignação e perplexidade que tomamos conhecimento de um relatório da ONU informando que nos próximos meses mais de um milhão de africanos irão morrer de fome.
Aqui mesmo no Brasil, apesar de todos os esforços do governo federal nos últimos anos, que retirou 28 milhões de brasileiros da pobreza absoluta e criou as condições para que 36 milhões ascendessem para a classe média, 16 milhões de pessoas ainda permanecem na pobreza extrema.
De acordo com o governo “são pessoas tão desamparadas que não conseguiram se inscrever, até mesmo, em programas sociais bastante conhecidos, como o Bolsa Família. Muito menos ter acesso a serviços essenciais como água, luz, educação, saúde e moradia.“
Na passagem do aniversário da morte do grande brasileiro e recifense Josué de Castro, e dos 65 anos do seu mais conhecido livro, nada mais justo do que lhe render uma homenagem, debatendo na Casa de José Mariano, alternativas para o combate a fome e a miséria do nosso povo.